Domingo, 1 de Novembro de 2009

OVOS FABERGÉ - O ÚLTIMO ESPLENDOR DA RÚSSIA CZARISTA

 

 
A Páscoa é a data litúrgica mais importante da Igreja Ortodoxa Russa. Momento de festejos e confraternizações, tendo como tradição a troca de ovos de galinha decorados, que representam o símbolo da vida renovada pela esperança. Quando o czar Alexandre III, em 1885, em comemoração à Páscoa, pediu ao joalheiro Peter Karl Fabergé, que fizesse uma jóia em forma de ovo para presentear a esposa, a czarina Maria Feodorovna, não sabia que se iria criar a tradição dos ovos imperiais Fabergé, verdadeiras obras de arte da joalheria universal, com peças únicas, de uma beleza imarcescível e de valor exorbitante.
A mística criada em torno dos ovos Fabergé sobreviveu ao fim do Império Russo, atravessou o tempo, mantendo-se como jóias raras e cobiçadas por colecionadores milionários. As peças têm cerca de 13 centímetros, feitas de metais de prata, ouro, níquel, platina ou cobre, decoradas com desenhos em detalhes coloridos, crivados de pedras preciosas como o quartzo, rubi, ágata, diamante, jade e lápis-lazúli. A genialidade de Fabergé criou mais de 140 tonalidades nas peças. Dentro dos ovos haviam miniaturas surpresas, confeccionadas por metais nobres e pedras preciosas.
Os ovos Fabergé foram todos criados para os czares Alexandre III e Nicolau II, pai e filho respectivamente, no período de 1885 a 1917, sendo oferecidos durante a Páscoa entre os membros da família real. Com a Revolução Russa, de 1917, Fabergé exilou-se na Suíça. Após os conflitos revolucionários, os cobiçados ovos foram expropriados à família imperial, alguns foram perdidos durante as pilhagens aos palácios, não se sabendo onde estão.
Tidos como expoentes da arte joalheira, os ovos imperiais Fabergé são hoje disputados por colecionadores de todo o mundo, alcançando grandes valores no mercado que negocia obras de arte. A Casa Fabergé persistiu ao tempo e às revoluções, sendo representada na França, Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos e Brasil. Nos dias atuais, produz séries limitadas de ovos, reproduzindo os desenhos originais das jóias imperiais russas dos séculos XIX e XX.
A lenda em torno dos ovos Fabergé é um dos enigmas dos tempos atuais. Sua beleza é ao mesmo tempo, o símbolo de uma opulência final, terminada com a tragédia do fuzilamento do último czar russo e de toda a família imperial. As jóias representam o último esplendor da dinastia czarista, então decadente e pronta para mergulhar nas trevas da história. A perfeição da beleza sedutora e mágica dos ovos ofusca a mística em torno dos extintos czares russos e da própria família Romanov.

O Primeiro Ovo Imperial

Peter Karl Fabergé nasceu em 18 de maio de 1846 do antigo calendário Juliano, adotado na época pela Rússia, ou, em 30 de maio, do calendário Gregoriano. Teria como nome de batismo Karl Gustavoich Fabergé. O pai, Gustav Fabergé, estabeleceu um bem sucedido negócio de jóias, em 1942, em São Petersburgo, que lhe permitiu enviar o filho para estudar na França, Inglaterra, Alemanha e Itália.
Aos 24 anos, em 1870, Fabergé herdou os negócios do pai, assumindo-os com maestria e, em pouco tempo, alcançando prestígio de grande joalheiro tanto na Rússia como em muitos países da Europa. Mediante ao reconhecimento do seu trabalho, Fabergé tornou-se o joalheiro oficial da corte imperial russa, em 1882.
Em 1885, Fabergé recebeu do czar Alexandre III, a encomenda de uma jóia em forma de ovo, para que pudesse dar à czarina, Maria Feodorovna, como presente de Páscoa. A tradição russa de trocar ovos de galinha decorados na Páscoa é comum aos cristãos ortodoxos. Inspirado na decoração milenar dos ovos, Fabergé e os seus artesãos criaram uma jóia única, de rara beleza, que viria a ser o primeiro ovo imperial. Aparentemente, a jóia parecia um pequeno ovo, lavrado em ouro e platina, esmaltado, mas ao ser aberto, revelava o seu magnetismo de beleza e originalidade, em que se apresentava uma gema de ouro, que dentro trazia uma miniatura em forma de galinha, com olhos de rubi e uma réplica em diamante da coroa imperial.
A imperatriz ficou fascinada com a beleza da jóia, levando o czar a encomendar a Fabergé, todos os anos, durante a Páscoa, um ovo para presentear Maria Feodorovna. O imperador exigiu de Fabergé que cada ovo fosse único e que tivesse uma surpresa dentro. Iniciava-se assim, a tradição dos ovos Fabergé na corte czarista, que a cada ano, trazia uma temática diferente. A tradição permaneceria após a morte de Alexandre III, seguida pelo sucessor, seu filho Nicolau II, persistindo de 1885, até a queda do império, em 1917.

A Expansão da Joalheria Fabergé

Por dez anos consecutivos, Alexandre III presenteou à mulher, durante a Páscoa, com um ovo Fabergé. O imperador morreria subitamente no final de 1894, sendo o “Ovo Renascença”, o último que deu a Maria Feodorovna.
Nicolau II, ao assumir o trono, continuou a tradição de oferecer um ovo Fabergé à família, durante a Páscoa. A coroação de Nicolau II seria tema de um dos ovos imperiais. O novo czar tomou como esposa Alexandra Feodorovna.
Ano após ano, Fabergé e os seus artesãos surpreendiam com obras únicas, com motivos temáticos inesgotáveis, de genial criatividade e talento técnico beirando à perfeição. Os ovos Fabergé passaram a ser cobiçados por toda a corte czarista. Com a subida de Nicolau II ao poder, Fabergé passou a criar dois ovos anualmente, um para a nova czarina, Alexandra Feodorovna, outro para a mãe do czar, a viúva de Alexandre III.
Para não repetir os motivos temáticos dos ovos, Fabergé buscava inspiração no cotidiano da vida do czar e da czarina, e, em momentos da história da Rússia, exaltando obras, como a inauguração da estrada de ferro Transiberiana, que ligava Moscou à Sibéria, ou ainda, a geografia russa, como o Cáucaso.
Os ovos imperiais Fabergé, foram mostrados ao mundo, pela primeira vez, em 1900, na Exposição Universal de Paris, na França. A exuberância e beleza das jóias fascinaram os europeus, ganhando prêmios e honras, fazendo com que as jóias Fabergé alcançassem prestígio e fama por todo o continente.
Após a exposição de Paris, Fabergé ampliou consideravelmente os seus negócios, abrindo ateliês em Moscou, Kiev e Londres, em 1906. A supervisão desses ateliês era feita pelo próprio Fabergé. Neles eram produzidos baixelas de jantar, objetos de decoração, relógios, cigarreiras e isqueiros.
Grandes artesãos faziam parte da equipe de Fabergé, entre eles Michael Perkhin, Erik August Kollin e Henrik Wigström, que trabalhavam com exclusividade na criação de um tema escolhido para a confecção de um ovo, que a cada ano ficavam mais exóticos, atingindo a perfeição técnica, o apogeu do artesanato na confecção de jóias. A partir da fama que despertou os ovos czaristas, Fabergé passou a ser procurado por dezenas de clientes particulares, ávidos em adquirir suas jóias imponentes.

A Queda do Czar e o Fechamento da Joalheria

Enquanto a joalheria de Fabergé alcançava um apogeu, o Império Russo entrava em vertiginosa decadência. A criatividade genial de Fabergé exaltava os feitos do czar e da sua família, transformando-os em sofisticadas jóias de presentes de Páscoa; mas a insatisfação da população russa minava esta imagem de opulência, transformando Nicolau II em um dos homens mais impopulares da história do país. Cada vez mais distante do seu papel histórico, o czar viu-se isolado, mostrando-se fraco e de atitudes contraditórias. Envolveu a Rússia na Primeira Guerra Mundial, que ceifou milhares de vidas, trazendo grande humilhação para um povo carente e empobrecido.
A guerra afetou a obra de Fabergé, que se viu obrigado a utilizar com mais freqüência, materiais semipreciosos. A Rússia foi assolada pela fome, pela morte dos seus cidadãos nos campos de batalha, pela caótica administração de um czar fraco e impopular. Enquanto a população faminta invadia e saqueava as grandes cidades, Fabergé confeccionava os últimos ovos imperiais. As jóias ligar-se-iam para sempre à imagem da decadência do Império Russo, paradoxalmente tornando visível a miséria da população e a opulência de um regime falido.
Diante do cenário conturbado que se vivia, com greves e revoltas populares que levariam à queda do czar, Fabergé decidiu pelo fechamento da sua joalheria, em 1916, vista pelos revolucionários como símbolo da abundância corrupta da monarquia czarista. No dia 15 de março de 1917, sem apoio e prestígio, tanto da aristocracia quanto da população, Nicolau II abdicou. O czar e a sua família foram presos e enviados para a Sibéria.
A queda de Nicolau II, pouco antes da Páscoa de 1917, deixou os dois ovos imperiais daquele ano apenas na encomenda, eles tinham como temáticas “Madeira de Karelia” e “Constelação”.

A Mística dos Ovos Fabergé

Com a Revolução Russa, extinguir-se-ia a tradição dos ovos imperiais Fabergé como presentes de Páscoa. Nicolau II entraria para a história como o último czar da Rússia. No dia 17 de julho de 1918, Nicolau II, a czarina Alexandra Feodorovna e os seus cinco filhos, foram executados por um exército furioso de revolucionários.
Da tragédia dos Romanov, Maria Feodorovna, mãe de Nicolau II e viúva de Alexandre III, foi a única que escapou à vingança revolucionária, fugindo para a Inglaterra, a bordo do navio “Marlborough”. A rainha mãe ao fugir, levou consigo o “Ovo da Ordem de São Jorge”, o último que recebeu do filho, nas Páscoa de 1916.
Os outros ovos foram, em sua maioria, confiscados pelo novo governo estabelecido pela revolução, sendo enviados para o Kremlin, em Moscou. Muitos desapareceram durante os saques aos palácios dos Romanov.
Conseqüentemente, a Revolução Bolchevique transformou os ovos imperiais em objetos burgueses e sem função na nova história que se construía na Rússia, tirando-lhes o valor artístico e econômico, desvalorizando-os no mercado.
Fabergé teve o filho Agathon preso pelos revolucionários. Sua libertação foi negociada quando aceitou avaliar as jóias e pedras preciosas confiscadas aos nobres. Após executar este trabalho, Agathon foi anistiado.
Na Rússia bolchevique não havia mais espaço para Fabergé, considerado como autor de objetos fúteis e de luxuriante opulência burguesa. Sua arte de nada valeria para o ascetismo ideológico vigente. Fabergé exilou-se em Lausanne, na Suíça, vindo a falecer nesta cidade, em 1920.
Decorridas muitas décadas da Revolução Russa, os ovos Fabergé passaram a fazer parte do imaginário, dos mistérios e lendas que foram criados em torno dos malogrados Romanov. Não só a beleza estética das peças, como o significado histórico que representam e à tragédia que permeiam misticamente, fizeram dos ovos imperiais tesouros exorbitantemente valiosos, disputados por colecionadores de todo o planeta. Quando leiloados, são vendidos por grandes fortunas. Em 1992, um ovo Fabergé leiloado em Nova York atingiu o valor de 3 milhões de dólares; em 1994, um outro, leiloado na Suíça, foi vendido por 5 milhões de dólares; em 2002, um ovo imperial foi arrematado em leilão da casa Christie’s por 9,6 milhões de dólares. O mais caro de todos os ovos Fabergé foi vendido em leilão da casa Sotheby’s, por mais de 24 milhões de dólares, ele traz a figura da carruagem em que a czarina Alexandra Feodorovna passeava por Moscou.
Estimativas históricas registram que, entre 1885 e 1917, 56 ovos imperiais Fabergé teriam sido confeccionados. No fim do século XX, até 1998, 44 exemplares tinham sido localizados. Todas as peças foram feitas para os czares Alexandre III e Nicolau II.

Ovos Imperiais Fabergé

Ovos de Alexandre III presenteados à esposa, a imperatriz Maria Feodorovna:

1885 – O Primeiro Ovo Imperial – Galinha
1886 – O Segundo Ovo - Galinha com pendente de safira *
1887 – Ovo Relógio da Serpente Azul
1888 – Ovo Querubim e Carruagem *
1889 – Ovo Nécessaire *
1890 – Ovo Palácios Dinamarqueses
1891 – Ovo Memória de Azov
1892 – Ovo Diamantes Incrustados
1893 – Ovo Cáucaso
1894 – Ovo Renascença

Ovos de Nicolau II presenteados à esposa, a imperatriz Alexandra Feodorovna, e à mãe Maria Feodorovna:

1895 – Ovo Botão de Rosa
1895 – Ovo Doze Monogramas
1896 – Ovo Miniaturas Giratórias
1896 – Ovo Alexandre III *
1897 – Ovo Coroação
1897 – Ovo Muget *
1898 – Ovo Pelicano de Ouro
1898 – Ovo Vale dos Lírios
1899 – Ovo Relógio Bouquet de Lírios
1899 – Ovo Amores Perfeitos
1900 – Ovo Ferrovia Transiberiana
1900 – Ovo Cuco
1901 – Ovo Cesto de Flores Silvestres
1901 – Ovo Palácio Gatchina
1902 – Ovo Trevo
1902 – Ovo Empire Nephrite *
1903 – Ovo Pedro, o Grande
1903 – Ovo Jubileu Dinamarquês *
1904 – Desconhecido ?
1904 – Desconhecido ?
1905 – Desconhecido ?
1905 – Desconhecido ?
1906 – Ovo Kremlin de Moscou
1906 – Ovo Cisne
1907 – Ovo Grinaldas de Rosas
1907 – Ovo Troféu do Amor
1908 – Ovo Palácio Alexander
1908 – Ovo Pavão
1909 – Ovo Iate
1909 – Ovo Comemorativo de Alexandre III *
1910 – Ovo Colunas
1910 – Ovo Eqüestre Alexandre III
1911 – Ovo 15º Aniversário
1911 – Ovo Loureiro
1912 – Ovo Czarevich
1912 – Ovo Napoleônico
1913 – Ovo Tricentenário Romanov
1913 – Ovo Inverno
1914 – Ovo Mosaico
1914 – Ovo Catarina a Grande ou Grisaille
1915 – Ovo Cruz Vermelha com Tríptico da Ressurreição
1915 – Ovo Cruz Vermelha com Retratos Imperiais
1916 – Ovo Militar em Aço
1916 – Ovo Ordem de São Jorge
1917 – Ovo Madeira de Karelia (apenas encomendado)
1917 – Ovo Constelação (apenas encomendado)

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